Especiais de natal de
seriados não me atraem muito. É muito difícil gostar de uma coisa
tão distante de mim – sem rabanada, com neve e maratonas de
compras. É diferente dos filmes, porém – esses tem um gosto
irremediável de infância.
Mas mesmo que especiais
de natal não sejam minha praia, Black Mirror é. A série
britânica – que só peca pela mínima quantidade de episódios por
temporada, cada um contando uma história diferente – é
provavelmente a minha preferida, e quase sai correndo pela sala ao
descobrir o lançamento de White Christmas, o especial de
natal que precede a tão aguardada terceira temporada.
Mas é bom lembrar que
estamos falando de Black Mirror – ou seja, aqui não há
nada de corridas desesperadas ao supermercado em busca da ceia ou
aventuras sessão da tarde por de presentes. Para aqueles que não
estão familiarizados, Black Mirror é, no melhor estilo
Twilight Zone, uma série de fábulas, mas que ao invés de
alertar sobre a moral e os bons costumes, tece alarmantes previsões
sobre a tecnologia.
O mais fantástico
sobre a série é (com a notável exceção do segundo episódio da
primeira temporada) o jeito com que o pequeno mundo de cada episódio
é construído: longe das megalomaníacas e organizadas distopias, os
autores simplesmente inserem uma tecnologia ou duas diferentes (e que
provavelmente estarão disponíveis num futuro próximo) no nosso
mundo de hoje, tornando tudo extremamente crível. No caso de White
Christmas, estamos falando do Z-Eye – uma tela de computador,
só que vista através de seus olhos, uma versão um pouco mais
avançada do Google Glass. Além das óbvias vantagens – a
eliminação de celulares, por exemplo – o Z-Eye permite ao usuário
o bloqueio de pessoas na vida real: não se pode ver nem ouvir quem
está bloqueado. Muito útil para desconhecidos chatos. Enlouquecedor
caso um ente querido.
Nesse cenário temos
nossos dois protagonistas: Joe e Matt. Trabalhando em algum lugar
remoto e cheio de neve, os dois passam um desanimado natal juntos, no
qual Matt improvisa um jantar com umas garrafas de vinho e pergunta a
Joe sua história – afinal, para estar ali, sem o Z-Eye, ele
provavelmente fez algo bem ruim.
A partir daí White
Christmas se desdobra em diversos questionamentos sobre ética e
privacidade. Matt, por exemplo, tinha como hobby ajudar vários caras
em um grupo a ficar com mulheres – uma espécie de Julien Blanc
menos agressivo, mas com total acesso ao que o rapaz da vez vê
através do Z-Eye, passando-lhe conselhos através de um ponto
eletrônico.
Não posso falar muito
mais sem entregar partes significativas do enredo, mas White
Christmas é, até agora, meu especial de natal favorito –
embora não ganhe o posto de número um se considerarmos os outros
episódios da série. Com um final bem construído e surpreendente,
ele não falha no estilo Black Mirror de deixar o espectador
boquiaberto.
Tem neve? Sim. Mas de
qualquer maneira é fácil de se identificar com os questionamentos
feitos por White Christmas – que não é, de maneira alguma,
seu especial de natal comum.