22 dezembro 2014

Uma noite de crime: anarquia (filme)



Uma noite de crime não surpreendeu muito: apesar da excelente atuação de Lina Hadley (a Cersei de Game of Thrones) o filme não passou muito do clichê de cenas de ação sagrentas, sem mostrar as reflexões que a sua versão distópica dos Estados Unidos oferece. A sua sequência, Uma noite de crime: anarquia, porém, conseguiu preencher bem algumas destas colunas.


Não temam por spoilers – embora parte de uma mesma franquia, os dois filmes só têm em comum o mundo em que se passam. Os chamados “novos pais fundadores” deram aos americanos um direito curioso e assustador: o de cometer qualquer crime, assasinato incluso, em um período anual de doze horas, celebrado como um feriado nacional. Os ricos – como a família protagonista do primeiro filme – trancam-se em suas casas com sistemas de segurança moderna, caso não tenham escolhido “Expurgar”. Palavra curiosa, refere-se a “limpeza” que seria feita nas almas de todos os participantes da noite, o Expurgo, justificativa para todo este absurdo: purificados de toda a violência sem o risco de punição, os americanos não teriam razão para cometé-la em outro dia do ano, diminuindo assim as alarmantes taxas de crimes. Expurgar, portanto, não se torna só uma prática aceita, mas também louvada, uma prova de status e força.


Mas entre aqueles que escolhem a suposta segurança de suas casas, são os mais pobres não tem muita sorte: a garçonete Eva e sua filha Cali não contam com muito mais além de algumas tábuas de madeira e uma arma para a sua proteção. Expulsas de seu lar por um estranho grupo que aniquila todos seus vizinhos, elas são acolhidas pelo Sargento, homem em busca de vingança com habilidades o suficiente para manté-los vivos.


Uma noite de crime: anarquia acerta em cheio ao mostrar a perspectiva da noite do Expurgo das ruas – tanto as vítimas ocasionais (um casal cujo carro quebra e fica preso) quanto os mendigos e pobres já “marcados para morrer” por participantes do Expurgo tem sua vez. Não é esse o maior mérito do longa, porém: ao contrario de seu antecessor, Uma noite de crime: anarquia mostra as raízes e o objetivo do Expurgo, uma evidente política governamental de controle da população pobre; que em tempos de discussão acalorada nos Estados Unidos quanto ao ocorrido em Ferguson, tem sua enorme relevância. Pode parecer absurdo para americanos e também para brasileiros, mas ao menos no meu país – onde práticas de linchamento são louvadas culturalmente, caso a torta justiça popular decida que há razão para tal – não tenho muita certeza se está tão distante da realidade.


O filme acerta também em não espetacularizar as mortes: todos os assassinatos são postos como crimes brutais, e os maiores vilões são, além do governo que sanciona essa prática abominável, os ricos que expurgam como um esporte, comprando “presas” e matando-as em ambientes limpos, confortáveis e seguros – um Jogos Vorazes um pouco torto, do qual os habitantes da Capital participam ativamente. O único grande erro de Uma noite de crime: anarquia é deixar algumas pontas irritantemente soltas – introduzido logo no início, um grupo anti expurgo tem aparições pontuais e poucos explicativas, mesmo que (tenho de dar o mérito) cheia de bem vindas referências aos movimentos por direitos civis, paralelo crível e bem feito. É evidente que isso foi feito para permitir continuações, mas seria inteligente da parte dos realizadores respeitar a estrutura desse tipo de série e tornassem cada filme mais independente.



Uma agradável surpresa, Uma noite de crime: anarquia leva três estrelas e meia.

4 comentários:

  1. Tenho um misto de vontade e preguiça de ver o primeiro filme. Uma hora acabo assistindo!

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    1. O primeiro é meio ~white ppl problems~, mas esse daí problematiza mt mt bem o Expurgo :)

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  2. Eu nem sabia da existência desse filmes hehhe. Me interessei pelo o que você falou do filme, então vou procurar para assistir os dois.

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    1. Assista, é mt bom! Ao mesmo tempo que é entretenimento, traz reflexões interessantes...

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