18 junho 2013

Ouça-me rugir: notas sobre as manifestações



A protagonista do filme Do outro lado, Ayten, é membro de um grupo político de oposição em seu país, a Turquia. Como os recentes acontecimentos envolvendo a praça Taksim mostram, a democracia do país não anda lá em bons lençóis, e como bom espelho da vida que é a boa arte, Do outro lado coloca a organização de Ayten (e ela mesma) como marginalizada e perseguida pelo governo turco – por seu ativismo, a garota é presa, leva incontáveis surras, se auto-exila e outras coisas mais.

O curioso é que quando a sra.Obermuller a questiona sobre os ideais de seu grupo, Ayten dá uma resposta genérica, repetitiva e confusa – o equivalente turco ao nosso “o Brasil é pão e circo” ou “abaixo a corrupção”. Ou seja: Ayten deu seu sangue e suor literais por uma causa que desconhece, algo nebuloso. Ela tem revolta, energia e vontade, mas qual seu alvo?



Essa, meus amigos, é minha maior reserva quanto aos protestos que estão acontecendo no Brasil. O gigante acordou, mas acordou pra quê mesmo?

Moro em Feira de Santana, pequena metrópole no interior da Bahia. O nosso protesto está marcado para a quinta-feira as quatro horas, iniciando-se na Praça do Gastão, ponto estratégico da cidade. Me doeu ver que o ato está marcado quando justamente estarei no check-in voltando para casa depois de um compromisso inadiável, impossibilitando então a minha ida.



Pensando em ajudar com as minhas meras migalhinhas, então, combinei com meus amigos de levarmos todos cartolinas, pilotos e tintas para a aula de amanhã, a fim de confeccionarmos cartazes. A atividade tem dupla função: despertar a curiosidade de outros colegas e o uso para aqueles de nós que irão para o protesto. Sentei-me, então, na hora do intervalo, pondo-me a pensar em frases adequadas e de impacto, que chamassem a atenção dos passantes que, muito provavelmente, teriam uma ideia pré-concebida pouco positiva sobre o que estávamos fazendo por lá.

Acabei encarando uma folha de papel em branco por vinte minutos. A questão central: pelo quê a gente tá lutando mesmo?



Assim como Ayten, parece que estamos combatendo tudo e nada ao mesmo tempo. Contra a violência estúpida e desnecessária dos policiais em São Paulo, contra a corrupção, contra os gastos excessivos na copa. A favor da saúde e da educação, da melhor mobilidade urbana e da moralidade no congresso nacional. Filho teu não foge à luta, Brasil, mas que luta é essa?

Amigos, não estou tirando a validade das manifestações nem nego que meus olhos se encham d’água quando ouço notícias sobre o comparecimento de milhares de pessoas. Vontade de me dividir em mil pedacinhos e estar nas várias cidades onde meus compatriotas tomaram as ruas, aqui e no exterior! Orgulho, orgulho que sempre senti por cada Marcha das Vadias ignorada, cada parada Gay insistente e denúncia de racismo feita, agora multiplicado pelos milhares e milhares de guerreiros que tomaram as ruas, a maior arquibancada do Brasil. Mas eu queria um foco, queria um alvo para atirar e superar, uma causa para vencer. Não é só por vinte centavos, mas É por vinte centavos. E amanhã pode ser contra a PEC 37 e depois em favor de uma reforma política – quem sabe? Essa grande dispersão que o movimento tem se tornado nesses últimos dias me deixa feliz (afinal, denuncia uma certa magnitude) mas como mediremos os resultados de nossos esforços? Como saberemos se o projeto de lei tal é um resultado destes ou mera manobra política?

Aos nove anos, apresentei um musical chamado Os saltimbancos, onde animais fugiam do julgo de donos exploradores. Não percebi, à época, o quão revolucionária era a tal peça, vendo-o somente há alguns meses, graças ao comentário de um amigo. Que nossa trilha sonora seja a música dos Saltimbancos – afinal, “todos juntos somos fortes, não há nada a temer”.




Texto escrito de forma rápida e furiosa – portanto, perdoem-me os eventuais erros e falta de qualidade, eu simplesmente não poderia deixar esse assunto passar. 


7 comentários:

  1. Seu depoimento foi um dos poucos que bateu tão certo no que eu penso, até escrevi sobre isso também. Tudo bem, super apoio as manifestações e farei um esforço pra comparecer na próxima aqui em Cwb, mas quero saber também do depois. E depois que a poeira baixar? Está faltando uma liderança. Gostando ou não, tivemos o Collor como líder do movimento que acabou levando-o à presidência, e agora está tudo um tanto quanto disperso. Lutamos por muitas causas, mas parece-me que falta o essencial: pedir a reforma política. Não é tirando a Dilma de lá que vamos resolver alguma coisa. Ela sai e vem outro pior! Imagina, Temer, Sarney, Calheiros?! Tá louco, povo tá precisando de um ajuste nesse foco. Ótimo texto Isabel. (:

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  2. Concordo que não há uma causa aparente, mas se manifestar já é um começo, o desafio a partir de agora é conseguir direcionar isso de forma realmente construtiva e mais especifica,para operar de forma mais significativa as mudanças que há tanto tempo queremos nesse pais.

    Thoughts-little-princess.blogspot.com

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  3. Realmente é perceptível que muitas pessoas estão
    indo na maré, sem nem sequer saber direito por que está lutando,
    mas mesmo assim fico feliz com essa união, fico feliz que finalmente estejamos lutando, ao invés de aceitar tudo com a cabeça baixa.

    http://soubibliofila.blogspot.com.br/

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  4. Ah! Isabel,

    Gostaria de saber a quantas anda o book tour,
    o livro já está em qual numero da lista?

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  5. Incrível, acabei de fazer um post sobre os protestos tbm rsrs
    Sua opinião é parecida com a minha, eu só fico na dúvida de... tá.. e se isso não der em nada? E se as manifestações não pararem nunca?
    Devíamos ter um foco, uma liderança, sei lá.
    Enfim, ótimo post
    Beijos

    www.lisz-tomania.blogspot.com.br

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  6. Bel, finalmente acessei o seu blog e que bom ler o seu texto. Tô contigo, precisamos saber contra que e contra quem se luta. Parabéns!!!

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  7. Concordo! É muito fácil ver aquela quantidade de pessoas e se juntar a elas sem saber ao certo o motivo de estarem ali...

    Beijos!
    http://caheoslivros.blogspot.com.br/

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