Vou falar por experiência própria,
mas acho que esse é um problema de toda uma geração – pelo menos
daqueles que, claro, tem um padrão de vida de classe média e acesso
aos principais meios de comunicação (posso parecer uma babaca de
vez em quando ao falar sobre essas coisas “gerais” que na verdade
não são acessíveis para boa parte da população, mas como falarei
de uma vida e de um mundo que não conheço de perto?).
Temos escolhas demais.
Isso não me veio como uma quase
epifania, como a maior parte das coisas que eu uso como minhas
clichês “frases de impacto” ou “teses gerais” do texto nesse
blog, mas como uma conclusão gradual, tirada ao longo de toda minha
adolescência e, talvez, ao longo de toda a minha vida. It's kind
of a funny story, livro de Ned Vizzini, me fez voltar a pensar
sobre isso.
Segundo Craig, o seu protagonista,
antes havia a crise do quarto da vida – aquela dos vinte e poucos,
como os personagens de Friends (série que, me desculpem,
nunca consegui chegar perto a gostar) ou as meninas de Girls
ou da personagem principal de Young Adult. Todos os
supracitados encontram-se no que deveriam ser os melhores anos de
suas vidas – se é jovem o suficiente para ainda ter toda a
vitalidade, saúde e falta de responsabilidades da adolescência, sem
os limites paternos impostos nesta.
Mas não, nem tudo é tão doce quanto
se lembram os mais velhos – hoje em dia, a maior parte dos jovens
nos vinte e poucos tem aquele sentimento terrível de underachieve,
ou seja, não estar (nem de longe) onde se esperava estar a esse
ponto. Os poucos que tem a sorte de fazer o que gostam não chegaram
lá ainda e vivem cheios de restrições financeiras e sentimentos de
fracassos; os presos em empregos que odeiam também lidam com isto,
com o adendo de se passar quarenta e quatro horas semanais em algo
que não se gosta de fazer.
Segundo Craig, porém, isso era antes –
sim, hoje em dia não se precisa mais esperar até os vinte e poucos
anos antes de pirar pelo número de escolhas a serem feitas e
responsabilidades a serem assumidas. Não, boa parte dos jovens
urbanos de classe média, seja no Brasil, nos Estados Unidos (onde
It's kind of a funny story se passa – mas especificamente na
cidade de Nova Iorque) ou em Mumbai, lida desde cedo com escolhas que
vão moldar seu futuro e personalidade de forma quase irreparável.
E sim, é opressor pensar a noite que
eu poderia ter escrito mais e estar agora revisando um livro melhor
feito; estudado mais durante o ensino médio e estar em condições
de concorrer à uma bolsa de estudos no exterior e até mesmo (por
mais que eu goste de estar aqui) escolhido outro país de intercâmbio
e tido uma experiência melhor em outros aspectos. A crise do quinto
da vida, como apelidada por Craig, é nada mais do que o chorar pelo
leite derramado e arrancar os cabelos por coisas que não se tem
muito controle – mas como evitar? Como evitar se é só esse mundo
cheio de escolhas (bem vindas, mas com efeitos colaterais) que
conhecemos?
O livro, aliás, é um dos melhores
sobre depressão que já li na vida. Craig da doença justamente por
se preocupar demais com o que está fazendo aos quinze anos de idade,
achando que sem sucesso agora, não obterá sucesso e felicidade
nunca. É aquela velha lógica dos pais que fazem filhos cursarem
direito quando querem estudar antropologia, dizendo que “o sonho se
persegue depois, com estabilidade financeira” - quando, na verdade,
já é mais do que provado empiricamente que não, raramente esse
plano de adiar a felicidade e tentar buscá-la depois dá certo. Sim,
sacrifícios devem ser feitos em prol do que se sonha – como
artistas que trabalham em um emprego durante o dia e fazem sua arte
durante a noite – mas não um sacrifício de corpo e alma, que põe
os sonhos e personalidade em segundo plano.
Com tanta pressão auto-imposta, Craig
não consegue sair da média, algo considerado execrável por todos
em sua super competiva escola em Manhattan. Com um clima semelhante
ao do pré-vestibular em grandes cursinhos brasileiros, a Manhattan
Executive Pre-Professional School não espera nada menos do que a
perfeição dos seus alunos – coisa que Craig não consegue
atingir, dando início a uma espiral depressiva, que suga as suas
energias e lhe impede de comer e dormir.
Já vou adiantando que o final do livro
é feliz, e apesar de recheado de acontecimentos trágicos, o miolo
não se torna pesado ou triste graças a voz irônica e crua de
Craig. O final para o autor do livro, porém, não foi como o de seu
personagem – há mais ou menos dois meses, Ned Vizzini se suicidou,
aos trinta e dois anos de uma vida cheia de batalhas contra a
depressão.
Hum, não me interessei tanto pelo livro, mas achei a sua resenha muito bem escrita. A sua forma de escrever é cativante e eu não pude deixar de apreciar isso. Parabéns, moça! Ótima resenha.
ResponderExcluirhttp://www.diarioruivo.com/
Caramba que resenha bem escrita, sobre o livro, me pareceu um livro o tanto peculiar, interessante, adoro livros com pegadas trágicas e que nos jogam a realidade imposta no mesmo. Enfim... Leria.
ResponderExcluirAté mais. http://realidadecaotica.blogspot.com.br/
Ollá ^^
ResponderExcluirNão é um dos gêneros mais preferidos meus, mas com todos que já comentaram é impossível não parabeniza-la pela belíssima resenha :D
Beijoxxx.
http://maria-gabriely.blogspot.com.br/
Isabel, eu tinha curiosidade de ler esse livro, mas acabei vendo o filme e meio que desisti depois disso. Não sei se é fiel ao espírito do livro, mas gostei bastante do filme.
ResponderExcluirE gostei bastante da sua reflexão. Acho que não tem idade pra se ter essas crises existenciais, porque a gente sente a pressão muito cedo, e não sabe muito bem como lidar com tudo. Fora que existe essa crença geral que nos empurram goela abaixo de que a gente *deveria* estar fazendo certas coisas, de que tem um jeito certo de viver, e a gente acredita, e... ugh. É bem difícil.
Muito boa resenha mesmo, como de costume.
Beijo!
Eu tenho muita curiosidade para ler esse livro, acho o tema interessante, e tendo passado por isso na adolescência, quero ver como a história se desenrola. Tão triste o que aconteceu ao autor, sempre corta meu coração quando leio uma notícia assim.
ResponderExcluirsobremimemeumundo.blogspot.com
Tu fala Tcheco ou não conseguiu aprender ainda? Tô pensando em ir pra alemanha mas tenho medo de não conseguir aprender nada e ficar boiando enquanto as pessoas falam,
ResponderExcluirEsse livro tinha A CARA do tipo de livro que eu leio, ele quebra meu coração e eu me apaixono. Mas não consegui ler mais do que umas 20 páginas, acho, e não sei porquê D:
ResponderExcluirNossa senhora.
ResponderExcluirLembrei agora que tinha marcado de ver o filme no filmow e acabei deixando eternamente pra depois, tava tão traumatizada (?) com o gênero que decidi que ultimamente tô preferindo coisas mais leves, não sabia que tinha o livro. Tua resenha tá maravilhosa, Isabel. Sério.
E meio que serviu muito pra mim, porque penso freneticamente sobre isso de a vida ser todo um processo de exclusão, seleção: a gente tem tanta escolha a fazer, e escolher uma só, no meio de tanta coisa boa, é algo muito complicado pra mim, abdicar de tantas outras coisas que poderiam dar mais certo pra mim, sabe? Enfim, se não fosse assim, não seria a vida.
Queria muito que alguma editora publicasse esse livro no Brasil. Vi o filme e me senti tão mais leve no final! No final de dezembro, quando soube sobre a morte do Ned fiquei muito triste, porque infelizmente ele não teve um final feliz como o Craig.
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