Na Londres do século XVIII,
uma jovem dama encanta a sociedade: Evangeline Bennet, filha de Julian Bennet
(o braço direito do rei) e agora noiva de Hector Callum, o arrogante e
riquíssimo terceiro na sucessão do trono.
Como boas histórias não são
feitas de felicidade e contentamento há, obviamente, um grande problema aqui –
Evangeline não quer se casar. Como era comum na época, ela está sendo obrigada
por seu pai, que quer se ver logo livre da maior lembrança da esposa morta, que
o é não só por seus atributos físicos, mas também por seus dons: uma espécie de
bruxa, a garota controla os quatro elementos.
O que já seria por si só
complicado por ser extraordinário e condenável (sobretudo para a época) se
torna ainda pior com um estranho atentado a vida do rei, onde o assassino se
dissolveu em ossos a sua frente. Uma outra caça as bruxas se inicia na capital
inglesa, e Evangeline, graças a seu pai, pode se tornar um de seus alvos.
Tenho muitos sentimentos contraditórios
quanto A linhagem. O primeiro reside
em uma reclamação que posso fazer quanto a vários autores nacionais, se opondo
completamente ao que eu disse, por exemplo, sobre A arma escarlate: qual o problema de uma história passada no
Brasil? Sim, sei que neste caso temos um romance histórico, mas ainda que as
coisas tenham mudado, sempre é mais fácil retratar com precisão uma cultura que
faz parte de nós. E como valorizar, a longo prazo, a literatura nacional se nem
nos aspectos primários (localização e nacionalidade dos personagens) ela se
diferencia da estrangeira?
Por que por falar em precisão,
senti, em muitos pontos, uma grave artificialidade em A linhagem. Não li muita coisa dessa época, mas alguns hábitos e
formas de falar me soaram muito, mas muito fora do lugar. Somando a isso alguns
erros de continuidade (refletidos, principalmente, em machucados que somem do
nada) ficou a dolorosa impressão de que mais uma revisão bem feita por um
copidesque ou até mesmo um beta reader afiado cairia bem.
Soa meio doentio digitar “pistolas
automáticas” no Google, mas faz parte do dia a dia de um escritor – nas minhas
pesquisas recentes, na verdade, você acharia como esconder um cadáver, sobreviver
na selva e fazer uma besta. Não sei qual é contrário de anacronismo, mas o
encontrei em A linhagem: além dos
comportamentos curiosos para uma dama do século XVIII, o livro retrata objetos
que não haviam sido inventados e coisas assim. O único quanto ao qual tenho
certeza absoluta são as benditas pistolas – o fato de que até o início do
século XX elas precisavam ser recarregadas com saquinhos de pólvora inviabilizaria
muitas das cenas de A linhagem.
Prefiro as espadas da fantasia épica. [E sim, eu consigo ser muito chata as
vezes – mas os errinhos me deram uma agoniazinha, então tenho de relatá-los.]
Bom aqui entram os sentimentos
contraditórios que me fazem ter uma dor de cabeça ao escolher a nota que darei
a este livro. Em primeiro lugar, a narrativa é maravilhosamente fluida, me
fazendo devorar A linhagem em
pouquíssimos dias. Há, porém, a recorrência de alguns clichês, que não se
resumem a, mas se encontram principalmente no romance de Evangeline com Henry,
o seu cocheiro. A essa altura da minha
vida de leitora, eu já deveria ter aprendido a ignorar isso, mas...
Não dá.
Mesmo ansiando por saber o que
aconteceu na história entre as sessões de leitura, fica aqui a irremediável
sensação de que faltou alguma coisa em A
linhagem – havia aqui um incrível potencial que não se concretizou como
deveria...
Oi Isabel!
ResponderExcluirTenho lido muitos comentários sobre A Linguagem, em sua maioria, positivos. Concordo plenamente contigo: "como valorizar, a longo prazo, a literatura nacional se nem nos aspectos primários (localização e nacionalidade dos personagens) ele se diferencia da estrangeira?" Me pergunto isso frequentemente, apesar de apoiar muito a nossa literatura!
Beijos!
Entendo todas as suas críticas. E isso me faz ir ler o livro com menos expectativa. Ele está na minha lista de leituras do ano.
ResponderExcluirAcho que a gente tem mesmo que começar a localizar as histórias no Brasil, mas como alguém que escreveu uma história que se passa em outro país, defendo que quando você tem a ideia é difícil mudar o que você imagina. Só que realmente concordo que temos que começar a colocar as histórias no nosso país.
Beijos,
Carissa
Carissa, já eu penso o contrário como escritora: sempre que tive uma ideia que se passa, por exemplo, em um high school americano, ocnsegui mudar as coisas para terras brasileiras. Com certa dificuldade? Sim, mas o resultado final é sempre melhor quando se trata de algo que você conhece...
ExcluirEu não acho difícil alterar minhas histórias pensadas em lugares internacionais - consequência óbvia e inevitável para qualquer um que cresceu com J. K. Rowling, Christopher Paolini, Tolkien e afins - e concordo com você que a cultura e localização nacional dos enredos deveriam ser mais explorados pelos escritores que aqui residem. Acho que há uma carência enorme disto; no entanto (sei que não disse isso em nenhum momento da resenha: é apenas um ponto meu), um escritor brasileiro escrever sobre um lugar além-fronteiras nacionais é tão plausível e admirável quanto um que escreve sobre as nossas terras no sentido de esforço imaginário e de pesquisa. Afinal: escrever sobre locais onde você nunca esteve, se guiando no máximo por experiências contadas ou Google Maps e Wikipédias, para mim, é um corajoso e notável salto no escuro.
ResponderExcluirAdorei a resenha, Isabel! Bem verdadeira e sincera. O tipo de resenha que gosto de ler. Sucesso!
(http://mon-autre.blogspot.com.br/)
Não foi tão óbvio e inevitável para mim, ou pra Renata Ventura. E bom, Paolini e Tolkien escrevem literatura fantástica ambientada em terras próprias, o que não conta bem como internacional... Além disso, acho difícil que uma experiência que toma somente algumas horas por dia (a da leitura) supere a experiência diária, real e dura da vida em si.
ExcluirEnfim, vejo esse "salto no escuro" como extremamente inocente: como querer descrever os cheiros e a sensações de se estar e viver em um lugar melhor do que os nativos, que se vêem em profusão nas livrarias? Por mais que se pesquise, há algo intágivel na cultura, que um estrangeiro nunca vai conseguir reproduzir. É corajoso sim, mas do jeito ruim.
Bom, posso mudar de opinião um dia, assim que ver um livro nacional escrito em terras estrangeiras que não padeça dessa estranha, intensa e evitável artificialidade.
Obrigada pelo comentário, e pela reflexão ^_^ Sempre bom ver opiniões divergentes por aqui!
Também tive problema ao ler um livro de fantasia, de uma autora nacional, em que os personagens falavam todos da mesma maneira, nem havia diferença entre personagens de idades diferentes, e isso me incomodou muito.
ResponderExcluirTambém acho que autores nacionais muitas vezes poderiam escrever histórias que se passam aqui, e eu acho que muitos o deixam de fazer por que acham que uma história em um outro país atrairia mais a atenção dos leitores.
bjks
Oi, Isabel!
ResponderExcluirAinda nem tinha ouvido falar de A Linhagem, mas gostei que você chamou atenção sobre o livro ser nacional e a história se passar na Inglaterra do século XVIII. Eu, particularmente, já fiquei incomodada com o clipe da Tulipa Ruiz que foi filmado em Londres, imagina como me sentiria com um livro que não só fala de um lugar tão distante, mas também de séculos passados... É uma escolha bastante curiosa essa do autor.
Isso sem contar no sobrenome Bennet, "será" que o autor não quis escrever o novo Orgulho e Preconceito? haha.
Até mais!
Gabriela.
Eu não tinha ouvido falar desse livro, achei muito legal que meu primeiro "contato" com ele tenha sido através dessa crítica, assim, se eu chegar um dia a pegar pra lê-lo, já tenho uma boa noção de como será.
ResponderExcluirAh, eu já baixei o Insanity que vc falou, achei pesado demais pra mim, preferi o Hip Hop ABS (também do Shaun T), que é mais light :) Mas, boa sorte nos seus treinos! =D
Beijos
Hey,
ResponderExcluirBom eu não me importo com alguns certos clichés quando a leitura é fluida, então acho que vou gostar muito de A Linhagem. Vou adiciona-lo a minha lista de desejados *u*
Beijos
Pepper Lipstick
Eu ainda não tinha ouvido falar desse livro, achei interessante. Na verdade não vejo problema algum em um escritor brasileiro criar histórias que se passem em outros lugares, acho que isso não influencia a não ser que os personagens ou o enredo tenha alguma referência à nossa cultura.
ResponderExcluir