Em
teoria, conhecer o passado nos ajuda a tomar decisões mais acertadas
para o presente. Guerras poderiam ter sido evitadas se os governantes
olhassem para a história, e em nossas vidas passos mais acertados
poderiam ter sido dados se usassemos o ontem como referência. Não
vem funcionado muito bem, mas bom, é o que temos.
A
sociedade de O doador de memórias, porém, escolheu esquecer.
Mas não escolheu esquecer só os fatos históricos de guerras e
destruição, mas os personagens desconhecem também qualquer coisa
fora dos limites bem planejados e regras milimetricamente executadas
de suas comunidades. Adotou-se a chamada Mesmice, e junto com a fome,
a guerra e a violência, exterminou-se também os sentimentos
profundos, o amor, as cores e a diferença. Esta última ainda
existe, é claro, mas de forma tão sutil e controlada que não traz
o problema e a beleza que o divergente geralmente carrega consigo.
Tudo
na sociedade é controlado pelos Anciões, do qual o mais importante
provavelmente é o Recebedor de Memórias - por que sim, se a
história é um ótimo guia, as comunidades não sobreviveriam sem
ajuda para tomar suas decisões. Além de todos os fatos já
ocorridos, o Recebedor contém em si toda a dor e a beleza perdida
pós a mesmice, e é o único a possuir livros que não o manual de
regras.
Uma
das poucas ocasiões em que se celebra as diferenças nas Comunidades
é a cerimônia dos doze, na qual todas as crianças recebem sua
futura profissão, decidida pelos Anciões. Jonas, nosso
protagonista, espera a dele com ansiedade - a escola, dedicada
principalmente ao aprendizado das regras da Comunidade, ficará em
segundo plano, e a profissão será aprendida.
Mas
Jonas não recebe uma profissão comum, como seus amigos - nada de
diretor de recreação, Criador de bebês ou cuidador de idosos: ele
será treinado para o mais importante posto na Comunidade, o de
Recebedor de Memórias.
Introduzido
em um mundo de belezas e dor que nunca havia imaginado existentes,
fica em Jonas a dúvida do que seria mais egoísta: privar a sua
comunidade do amor ou apresentar a eles a dor.
O
doador de memórias é um daqueles livros que divide qualquer um
que os resenha. Em primeiro lugar, é importante observar que se o
leitor já conhece algumas das distopias mais famosas (clássicas e
contemporâneas) ele ou ela vai certamente encontrar vários pontos
semelhantes. Há a supervigilância de 1984, as escolhas
impostas desde cedo de Divergente e até mesmo alguns toques
de Admirável Mundo Novo, ao passo que a autora suprime na
construção do mundo instituições que vemos como naturais, como a
família "vivípara".
Mas
sendo os livros supracitados e O doador de memórias pertencentes
ao mesmo subgênero, semelhanças são inevitáveis. Afinal, se
torcessemos o nariz toda vez que um autor de fantasia utilizasse
elfos em sua obra, acusando-o de plágio, o fantástico seria
inexistente na literatura.
Isto
sendo dito, não foi exatamente a semelhança com outras distopias
que me incomodou em O doador de memórias, e sim tudo que é
inexplicado ao final do livro. É impossível colocar aqui sem dar
spoilers, mas aqueles que nem eu que são fãs de histórias onde não
sobra ponto sem nó ficarão um pouquinho frustrados.
Só
que, apesar dessa minha resistência, O doador de memórias
tem pontos que conquistam. Com a linguagem simples do ponto de vista
de um menino de doze anos, o livro é maravilhoso em descrever cheio
de emoções a primeira vez em que Jonas vê a neve, sente a brisa do
mar no rosto e entende o real significado da palavra amor,
considerada anacrônica pelos padrões da comunidade. Como The
Children of Men (embora em um nível bem menos profundo) O
doador de memórias dá uma sensação de vazio estranha quando
se vira a última página, acompanhada pela vontade de chorar em
posição fetal na cama.
que saudade de chorar lendo um livro!
ResponderExcluirjá li a metade de ODDM ano passado, mas tive que parar porque meu tempo começou a ser todo para outras áreas, mas possivelmente eu o leia em breve, mas eu não curto muito essas tais "pontas soltas", dai fico meio receoso!
parabéns pela resenha.
gabryel fellipe - quimeras mirabolantes
Gabryel, tem umas continuações... Talvez tenham resolvido isso lá, né? Ou ao menos eu espero ahah
Excluircara o final desse livro da uma tristeza pq vc quer saber se deu tudo certo mesmo ;w;
ResponderExcluirSeguindo o Coelho Branco
Sim, é meio mal explicado... Mas tem continuações :3
ExcluirOi Isabel, tudo bem?
ResponderExcluirAdorei sua resenha! Parabéns, você escreve muito bem :D
Ah, esse livro me lembrou um pouco Divergente, pelas coisas que você contou sobre a estória - se você ainda não leu toda a trilogia, não sei se você entendeu, hehe). Sinceramente não sinto muita vontade de ler esse livro, desde a primeira crítica que li, achei ele mais do mesmo. E agora você dizendo que nem tudo ganha um desfecho... confesso que desanimei de vez.
Beijos,
http://winterbird.com.br/
Tem uns aspectos que lembra sim hihi Mas afinal, é o mesmo gênero... Enfim, é uma série, mas não sei se vou ler todos...
ExcluirBom... Não acho que tenha semelhanças com outras séries, porque o modo como eles vivem nesse livro é extremamente rígido, eles nem mesmo conseguem visualizar as cores né. E o final, apesar de também ter ficado um pouco frustrada, dá a entender tudo o que vai acontecer depois daquilo. Creio que a autora deixou tudo pra nossa imaginação, mas que é óbvio: as coisas voltaram a ser como eram antes, como são atualmente :/ Por isso ele é ótimo pra refletir bastante a respeito de até que ponto seria bom se manter vivendo daquele jeito?
ResponderExcluirxx Carol
http://caverna-literaria.blogspot.com.br
Tem resenha nova no blog de "Encarcerados", vem conferir!
É, eu tb não achei tanto... Mas a parte de escolhas importantes feitas na idade X, por exemplo, é semelhante a alguns outros livros.
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