30 dezembro 2011

Notas sobre a estrada ou céu de marshmellow



5h - Ah, eu odeio. Odeio acordar tão cedo, com a luz na minha cara e minha mãe me chamando. Não que eu estivesse dormindo antes, aliás. As vozes dos outros membros da minha família - cujo único ponto de interseção é a altura - já haviam me acordado há algum tempo.
5h30min - Não gosto de fazer as coisas no automático, mesmo que as mesmas sejam diárias. Me sinto menos humana se não tenho que pensar sobre o que fazer, como fazer, então acho agradável "mandar em mim mesma" todas as manhãs. Tal esquema, contudo, tem seus pontos negativos: eventualmente esqueço de fazer algo. Tipo pentear os cabelos. Ou escovar os dentes. Ou... Enfim, só enfiei a roupa e entrei no carro.
5h45min - Por mais chato que seja acordar cedo, é gostoso ver a cidade amanhecendo. Por mais que ver o nascer do sol na praia seja fascinante, nada se compara aos tons rosados e alaranjados em degradê (do tom mais forte a um bem clarinho, da jujuba ao marshmellow) que pinta o céu do sertão no inicio e no fim do dia.
E também tem as pessoas: é ótimo observar os trabalhadores saindo de suas casas para labuta; os feirantes arrumando suas barracas e os festeiros voltando para casa cambaleando nos seus pés.
6h15min - Outra cidade, bem pequena - e me falta a animação para perguntar ao meu pai qual é. Pessoas saindo de uma padaria num prédio antigo com sacos de pão quentinho. Um cinema antigo abandonado. Engraçado, não sou muito saudosista. Rolo os olhos para expressão "aquele era um tempo bom..." pois acredito que apenas três fatores ditem se o tempo é bom ou não: a guerra ou a paz; a fome ou a fartura; seu cansaço ou vontade de viver.
Mas esta aí uma coisa que não vivi mas da qual sinto saudade - os cinemas. Hoje, é difícil encontrar um fora dos shoppings (exceto pelas grandes cidades, e olhe lá), os famosos multiplex, quase sempre somente exibem filmes comerciais sem muita mensagem. Não vivi, mas me contaram, me contaram do tempo em que quase toda cidade, mesmo as minusculas, possuia um cinema. Não era muito sofisiticado, é verdade: apenas umas duas centenas - as vezes até menos - de cadeiras e um projetor, financiados por um sujeito qualquer com um pouco de dinheiro a mais e uma empolgação pela sétima arte. Se eu possuise uma máquina do tempo, essa seria a minha primeira parada.

6h28min - Não penso muito na morte: acredito ter pelo menos mais uns oitenta anos de vida, assim por alto. Como toda adolescente na TPM, brigada com mundo, já imaginei a minha morte uma ou duas vezes - com todos chorando, punindo-se por terem me tratado mal - mas nada nunca demais. Contudo, a estrada desperta esse tipo de pensamento - de morte - em mim. Talvez seja a maravilhosa sensação de deslizar pela estrada, com uma velocidade que nunca atingiriamos na cidade, com o vento no rosto, que me lembre a Rose de Titanic. Ou talvez seja o friozinho cada vez que um caminhão passe perto demais. Ou ambas as coisas.

29 dezembro 2011

O problema é admitir que se tem um problema



Dando uma pausa na resenhas de filme – to até enjoando levemente de escrevê-las, embora seja divertido – vamos lá com um tabu: preconceito. Um ótimo – como sempre – post no blog da Lola
me inspirou a falar sobre isso.
Mas antes que você pare de ler, já aviso: não vou dar lição de moral nenhuma sobre como é feio ser racista, como a homofobia é um câncer para a sociedade ou como o machismo mata. Não, não é isso: acho que todos nós já ouvimos broncas o suficiente na vida para internalizar esse tipo de coisa.
Vamos do que eu vou falar: dos doze passos. Criado nos anos trinta por um médico, eles possuíam como objetivo “resgatar” alcoólatras. Por seu grande sucesso, hoje existem grupos de apoio que aplicam os doze passos em todo tipo de vício. O primeiro passo, em suma, diz: assuma que você tem um problema.
É aí que chegamos no tal do preconceito: este é um problema que quase todas as pessoas não admitem que o tem, embora seu comportamento hostil com certos grupos seja evidente
.
Apesar de viver em uma sociedade racista, misógina e homofóbica, só ouvi a declaração ipsis libris de tais preconceitos duas vezes. Isso deveria ser algo bom. Deveria mesmo: uma garota, aos dezesseis anos, só ter presenciado a assinatura do atestado de imbecilidade alheio duas vezes. Ou eu moro em um país perfeito ou todo mundo tá com sindrome de Ali Khamel (para quem quiser se divertir um pouquinho, sugiro essa
leitura sobre as pérolas do diretor de jornalismo da globo). Mas não é: apenas demonstra que estamos tapando o sol com a peneira. As recepções de alguém que levanta e diz “sou racista” na maioria dos círculos são de choque: logo se pensa que o dito cujo é um nazista sem coração, que deseja enfiar todos os negros numa câmera de gás e atira em cachorrinhos; não como uma pessoa que foi criada para ser racista e se esforça, cada dia mais, para se livrar dessa educação negativa.
Da minha parte, já consegui alguns avanços: quando admiti que as palavras “piriguete e vadia” (que usava mentalmente com a alguma freqüência) eram de um machismo horrível da minha parte, aprendi muito, assim quando como parei de olhar atravessado para garotas de roupas curtíssimas na rua. Senti nojo de mim mesma por ter passado os primeiros dez ou doze anos me referindo ao cabelo afro como “cabelo ruim” (não porque achasse isso, mas por hábito mesmo), mas isso já não me pertence mais. É como disse Gandhi: “acreditar em algo e não vivê-lo é desonesto", e acreditar na igualdade e não refleti-las em suas ações não adianta nada.
Pois é, isso é uma daquelas questões que me deixa em um impasse: como deixar que as pessoas admitam que são preconceituosas – podendo assim melhorar e deixar de sê-lo – sem ser conivente com o próprio preconceito?

28 dezembro 2011

F2 + F3: Geração Prozac


O que acontece quando você vai ao cinema assistir missão impossível e a sessão já lotou? Se você respodeu assistir um filme de ação idiota e se decepcionar, acertou.
OK, vamos lá: o problema é que eu realmente não gosto do gênero, mas, "Os especialistas" até que foi bem executado. Mas não é sobre ele que escrevi, e sim sobre "Geração Prozac".
Elizabeth “Lizzie” Wurtel, uma garota brilhante academicamente e uma ótima escritora – mas cheia de problemas com a mãe rígida e o pai ausente – inicia seu primeiro ano na Universidade Harvard. Tudo vai muito bem – ela tem uma colega de quarto legal, vida social, admiradores, amigos, ganhou um prêmio de jornalismo e até chegou a publicar um artigo na revista Rolling Stone – quando uma das suas constantes na vida deixa de existir: ela não consegue mais escrever.
A partir daí, tudo vai mal para Lizzie: ela começa a abusar das drogas (que antes só usava “recreativamente”, por assim se dizer) não dorme, come ou toma banho e briga com todos a sua volta.
O filme me divide. Sei que é bastante desesperador perder um "dom" que você teve sua vida toda (ou qualquer coisa com que já esteja acostumada) e graças a edição bem legal e a uma atuação razoável da atriz principal, a depressão da mesma passa uma veracidade muito boa – talvez comparável a de Justine, personagem principal de Melancolia, que também gostei. Porém, em certos momentos, Lizzie torna-se insuportável por mergulhar em um mar de lamentações e auto-piedade, e o filme tenta, mas falha em justificar o comportamento melodramático da sua mãe - porque é normal que uma mãe que criou sua filha sozinha se sinta sobrecarregada, mas não é normal que a mesma se lamente por isso pelo resto da vida e jogue isso em cima da supracitada prole.
Não sei se no livro no qual o filme foi baseado – que é uma auto-biografia dos anos depressivos da autora – o mesmo ocorre, porém, o título não parece ser tão justificável: Lizzie só começa a usar o famoso anti-depressivo já no finalzinho do filme, com algumas reflexões interessantes sobre o que o mesmo pode causar na personalidade dos que os usam – a informação de que 300 milhões de receitas para Prozac foram emitidas em apenas um ano (creio que a estatística deva ser dos anos 80, quando o filme se passa) é alarmante.
Intenso. Se fosse para descrever “Geração Prozac” com apenas uma palavra, é essa que eu escolheria. Intenso, intenso o suficiente para me incomodar levemente e me fazer pensar sobre todas as pessoas que sofrem desse mal – o mal do século XXI, alguns dizem. Mas ainda senti que faltou alguma coisa.

O preço do amanhã + novo desafio


A adolescência te dá muitas vantagens. Nenhuma delas compensa os hormônios desregulados e ser dependente de todo mundo; mas antes tê-las do que não ter vantagem alguma.
Fui obrigada a refletir sobre algumas delas depois de assistir “O preço do amanhã”. Sempre que passa algum filme com cara de legal no cinema daqui, fico preocupada. Apesar de Feira de Santana não ser nenhum buraco perdido no meio do nada (há controvérsias sobre isso, mas eu sou quase uma Ms. Brightside), só temos um cinema aqui, o que me deixa a mercê, na maior parte do tempo, de desenhos infantis (os quais até gosto, mas tem um limite máximo de filmes da Pixar por mês para alguém com mais de doze), filmes de ação e comédias açucaradas.
Mas o filme realmente me surpreendeu. Uma das vantagens da adolescência que falei lá em cima é não precisar definir posição política – já que ninguém espera que você sequer ligue para política – e faço um ótimo uso dela: não acho que o comunismo seja uma opção, mas odeio a forma com que a economia mundial se organiza por sua obvia injustiça. Por isso, não dispenso uma crítica inteligente ao nosso sistema, que é o que “O preço do amanhã” faz: no mundo que o filme retrata, as pessoas são geneticamente modificadas para, fisicamente, nunca envelhecerem além dos vinte e cinco anos.
Depois disso, um relógio em contagem regressiva começa a rodar no braço de cada um, e, em um mundo em que o tempo é moeda, a lógica permanece a mesma que no nosso: para alguns serem quase imortais e desfrutarem do bom e do melhor, muitos precisam (depois de uma vida extremamente sofrida) morrer.
O enredo em si é cheio de clichês, admito: o seqüestro da menina rica, Robin Wood, crise de identidade e tal. Contudo, esse limbo no roteiro permite duas reflexões:
a) É ético e humano que alguns desfrutem do bom e do melhor quando outros morrem pela falta do que poderia ser suprido pelos excessos dos outros?
b) O dinheiro – ou o tempo, no caso do filme – realmente traz a libertação ou nos dá uma cautela podre e uma falsa impressão de que vai durar pra sempre?
A crítica que “O preço do amanhã” faz ao capitalismo é bem levinha, quase subentendida. Tratar o tempo como dinheiro não está tão longe da nossa realidade – afinal, como diz o velho ditado, tempo É dinheiro – mas colocar isto dessa forma talvez nos faça enxergar de uma maneira mais sensível. Outro ponto para a ficção distópica. o/

OBS.: Esse filme não entra no desafio dos 100 filmes por eu ter o asssistido há um tempinho já.
OBS2.: Como o meu maior objetivo com o 100 filmes e 70 livros é diversificar minha matriz de gêneros, resolvi entrar no Desafio Literário 2012. Ainda não me inscrevi, porque as inscrições foram fechadas e só reabrem em janeiro, mas pretendo faze-lo. Uma boa maneira de ler gêneros diferentes!

27 dezembro 2011

Desafio 70 livros e 100 filmes + F1: Juventude transviada



Há algum tempo já que quero manter um registro minimamente organizado do que leio e assisto. Digo isso porque não faço a mínima ideia de quantos livros ou filmes assisto em um mês, ainda mais em um ano. Até para estimar fica difícil: em algumas semanas chego a ler quatro, cinco livros, e assistir um filme por dia. Em outras, não leio nem assisto nada - nem as reprises da globo.
Pensei um pouco sobre isso, e cheguei a conclusão de que cem filmes e setenta livros em um ano são números plausíveis. Comecei no dia 25/12, com Juventude Transviada. Eis minha humilde opinião sobre este clássico do cinema:

Gostei de “Juventude Transviada” (e não só porque o James Dean era tão lindo e bom ator que valeria pelas duas horas de filme). O retrato da adolescência é fiel, muito fiel: a angústia, o não querer crescer e uma falta de respostas e previsões para o futuro enlouquecedora é tão tangível e real no filme que a adolescente que vos fala ficou maravilhada.

A estória do filme em si é banal. Ao ser preso por bebedeira, somos introduzidos a Jim Stark (feito por James-lindo-Dean) e sua família, composta de uma mãe controladora - que não sabe como agir diante do comportamento adolescente do filho - e um pai tão confuso como sua prole.
Como maneira de fuga, os pais de Jim o carregam – e a sua avó, que faz algumas aparições – de cidade em cidade, na esperança de que o filho, na próxima, faça amigos e comece a agir “normalmente”. Finalmente, em Los Angeles o rapaz faz um amigo – John, também conhecido como Platão, um menino rico largado pelos pais que é nos introduzido no início do filme por ter atirado em cachorrinhos sem razão aparente (como se houvesse razão plaúsivel para atirar em cachorrinhos. Mas enfim, não é a discussão aqui). Obviamente o charmoso menino novo - que tem colhões o bastante para ser amigo do excluído da turma - ganha um desafeto logo no primeiro dia: Buzz, líder de uma gangue na escola e namorado de Judy (que, assim como Jim e Platão, também possui problemas com os pais e estava na delegacia na cena inicial). Depois de uma briga, Buzz convida Jim para um racha de carros roubados em um penhasco, atividade que consiste em dirigir o carro em direção ao despenhadeiro e pular antes que o mesmo caísse – aquele que pulasse primeiro seria o perdedor. É claro que isso acabaria em desastre: Buzz não consegue pular, e deste ponto em diante, tudo vai ladeira abaixo para Jim, Platão e Judy.
Como eu disse antes, não achei o argumento central tão legal assim, por ser cheio de clichês. Contudo, a atuação dos três personagens centrais justifica o filme por completo: as mudanças rápidas de humor e de atitude - Jim agarrado aos pés do pai é impagável - e todo o drama me fez realmente acreditar que os personagens passaram por aquilo. E, encerro com a frase proferida pelo imortal Jim Stark que resume muitos momentos (talvez momentos excessivamente dramáticos e melancólicos, mas vá lá, quem nunca fez um draminha sem grandes justificativas que atire a primeira pedra) pelos quais a maioria de nós já passou: "eu não sei o que fazer, exceto talvez morrer!".