10 agosto 2013

Sábado + livro = < 3: Caçadores de bruxas



Minhas expectativas para o primeiro volume da trilogia Dragões de Éter, Caçadores de Bruxas, eram altas: eu já havia ouvido falar bastante de Raphael Draccon, e os elogios eram inúmeros. Iguais aos meus nessa resenha.

Vamos começar pelo narrador: geralmente desimportante quando não é um personagem do próprio livro, aqui esta lógica se inverte, com um contador de histórias onisciente nos narrando diversas aventuras paralelas de uma forma que atiça a curiosidade do leitor mais desinteressado. Como ele sabe de tudo? Como ele consegue fazer algo como dar “pausa” em um cenário parecer a coisa mais ordinária do mundo? As digressões são gigantescas, muitas vezes ininteligíveis e estranhas, mas cada uma delas é necessária para sabermos mais sobre os fascinantes personagens que habitam Nova Ether.

Temos Primo Branford, o rei de Arzallum, responsável por vinte anos de paz e prosperidade e conquistador do próprio trono. Há algo de errado no paraíso, porém, com uma série de fatos bastante estranhos que inicialmente atingem o povo, mas depois começam a dizer respeito a própria família real.

Ariane e João têm histórias que gostariam que os coleguinhas esquecessem: ambas crianças figuraram os bafafás da capital do país, mas não por nenhuma brincadeira infantil ou erro bobo. A garota teve a sua avó devorada por um lobo marcado por magia negra; o garoto foi cativo de uma bruxa das trevas que queria cozinhá-lo para o jantar, fazendo sua irmã Maria de escrava. Além disso, o navio de um pirata há muito considerado morto se aproxima. Tempos sombrios, meu amigo, tempos sombrios.

Histórias já conhecidas, que se cruzam de uma forma bastante peculiar em Nova Ether, com referências e adições fantásticas. Nada mais a se esperar de um mundo que só existe porque semideuses pensam nele, e que é protegido por fadas avatares.

Começando pela parte ruim – porque é raro um livro que não a tem – eu vi uma simples contradição no primeiro volume de Dragões de Éter. Contos de fadas, cujo reconto são parte central e essencial do livro são maniqueístas por natureza, apresentando um mundo preto e branco a crianças – como se elas não fossem inteligentes o suficiente para entender o básico da relatividade das coisas.

Como um bom escritor, em pontos diversos, Raphael Draccon tenta quebrar esse maniqueísmo extremo e puro, inserindo situações que se eu narrasse figurariam como  spoilers, mas que com certeza serão lembradas por aqueles que já leram Caçadores de Bruxas. Em outros pontos, porém, ele não hesita em inserir figuras de “mal supremo e puro”, com fins e meios violentos e aterrorizantes. Nada do que chamamos de “característica redentora”, ou talvez uma justificativa, por mais parca que seja. Ah, como me irrita essa perspectiva de que qualquer um, seja na ficção ou na vida real, é inteiramente bom ou ruim! Alguns diálogos, graças a esse pequeno erro, soaram ligeiramente infantis. Felizmente, esse não é o padrão.

Porque sim, Caçadores de Bruxas não é só inovador quanto  ao seu narrador, mas os diálogos são interessantes também: sempre me perguntei porque havia a predominância da formalidade nas conversas de livros de fantasia, e este erro não é cometido em Dragões de Éter – ao menos não nas conversas dos núcleos jovens e plebeus.

O livro é lotado de referências (coisa que parece ser marca da escrita do autor, segundo resenhas que li) que não são feitas da forma usualmente prepotente (na qual o leitor deve conhece-la para entender uma piada ou situação) e sim sutil. Aqui existem também entrelinhas, mas elas não riem de você com escárnio, nem dançam na sua frente de forma explícita, somente estão lá, para aqueles que estiverem em momento e condição de compreende-las.

Geralmente aquelas frasezinhas no fundo (ou até mesmo da capa) do livro são um mar de puxa saquismo ao escritor, extremamente hiperbólicas e freqüentemente falsas. Quantos “melhor livro que já li” você já teve nas mãos?

As tais frasezinhas de fundo de Caçadores de Bruxas, impressionam por não serem exatamente hiperbólicas – todas estão dentro do real, e, na minha humilde opinião, do verdadeiro. O motivo vem com a segunda peculiaridade: nenhuma delas foi proferida por um grande crítico de jornal ou revista, e sim por outros escritores, blogs e sites especializados em literatura.

Nenhuma surpresa no Brasil, onde a crítica frequentemente ignora literatura de gênero. Mas não fez falta. Fico com a opinião de André Vianco: Raphael Draccon escreve muito, muito bem.

2 comentários:

  1. Estava mesmo querendo uma crítica sobre esse livro, mas que viesse de alguém que eu já conhecesse o gosto e já tivesse indicado coisas legais antes. E só comprovou que estava certa em ficar curiosa pelos livros do Draccon, agora é só ler e me certificar da qualidade. (:

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  2. Isabel, eu tenho um problema com esse escritor que, eu sei, é pura ignorância de minha parte, mas ele me não me causou uma boa impressão em uma entrevista que li uma vez (tentei procurar mas não lembro onde foi...tem uns bons anos já) e peguei trauma, mas agora vejo que é válido dar uma nova chance a ele, vou colocá-lo na lista, quem sabe me saio bem - depois que já tinha decidido não mais ler Riordan, vi tantos blogueiros em cujo gosto eu confio falando bem dele, inclusive você, que tive que me render, e estou até me dando bem com Cold Springs...

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