28 janeiro 2015

A comissão chapeleira (livro)


Comecei a minha trajetória no mundo da escrita escrevendo fanfics: o amor por Harry Potter era tamanho que os livros (na época, acho que quatro) publicados não eram suficientes. Eu queria passar mais tempo com os bruxinhos, ser amiga de Hermione, expandir seus mundos, viver em Hogwarts – e criar minhas próprias histórias baseadas nesses universos era uma maneira de fazer isso. JK Rowling, você me enfeitiçou, e eu não conseguia tirar seus livros da cabeça.

Me aposentei no ramo da escrita de fanfics, mas desde então, alguns livros me deram a mesma sensação de Harry Potter: eu queria estar presa em seu universo. A arma escarlate, primeiro livro da série de mesmo nome, já me introduziu a um universo fantástico no qual eu gostaria de viver – A comissão chapeleira, sua continuação, consolidou ainda mais isso.

[A partir daqui, a resenha contém spoilers de A arma escarlate. Se você não leu, confira essa resenha: a série é fabulosa, e merece ser conhecida por todo mundo por razões de sou fangirl ser muito boa.]

As eleições desse ano foram tensas. Ambos os lados fizeram campanhas bastante sujas, e os debates do segundo turno (depois da retirada da oposição inteligente de Luciana Genro e da cômica – mas de um jeito bom – de Eduardo Jorge) me davam ânsia de vômito.

O mundo bruxo brasileiro passa por algo parecido em A comissão chapeleira. Ao contrário do regime quase totalitário de Harry Potter, os bruxos brasileiros votam para o seu líder, e os nossos estudantes favoritos – os Pixies – estão bastante animados com as eleições. Pela primeira vez em décadas, um candidato de oposição tem chances de ganha-las: Átila Antunes, um acriano carismático com grandes planos para a educação bruxa brasileira.

Mas se Átila ganhasse as eleições dificilmente seriam parte do livro – quem acaba chegando ao poder é o conservador Lazai Lazai, que não parece, para os Pixies, uma grande mudança visto as décadas de governos semelhantes. Eles se enganaram: nada será como antes depois da chegada de Lazai ao poder. Cheio de medidas totalitárias a fim de “europeizar” o Brasil, a escola Korkovado nem parece mais a mesma bagunça fascinante de A arma escarlate. Impera o medo.

Depois dos desastres do último ano, Hugo tenta não se envolver em nada muito complicado, mas é obviamente bastante difícil: as consequências de sua venda de cocaína se mostram bastante, principalmente no mineirinho Eimi. Tenho que bater palmas de pé para a Renata nesse aspecto: fiquei com bastante medo de que o assunto não fosse desenvolvido e continuasse com as mesmas pequenas consequências do primeiro livro, incompatíveis com uma irresponsabilidade tão grande.

Falar em assunto bem desenvolvido, o livro é basicamente feito disso. Nos primeiros capítulos, torci um pouquinho o nariz para os diálogos (longos e com algumas opiniões batidas) dos Pixies sobre política. A comissão chapeleira, porém, desenvolve-os muito bem, falando de totalitarismo e rebeldia, lembrando bastante obras sobre a ditadura militar.

Os personagens, como é de se esperar, crescem – não só em termos de maturidade, mas também no coração do leitor. Nesse primeiro aspecto, está Viny, que desce de seu pequeno pedestal e se torna menos arrogante – apesar de adorar a ele e suas ideias desde o primeiro livro, o líder dos Pixies ganha um merecido banho de humildade. No segundo, Capí – eu não havia gostado muito de sua postura de salvador da galáxia antes, mas com alguns erros e demonstrações de fraqueza, ele se tornou o meu personagem preferido na série. Eu já queria estudar na Korkovado após ler o primeiro livro, e com este, tudo que eu quero é ser uma Pixie.

Que, aliás, não são os únicos personagens desenvolvidos nesse livro: ao longo das mais de seiscentas páginas, vários dos personagens secundários que ficaram um pouco apagados no primeiro livro crescem imensamente. Renata Ventura não introduz nenhum detalhe sem razão, e nada está ali para “encher linguiça”, com uma minúcia digna de George Martin.

Já quanto a Hugo, bom... O polêmico protagonista está mudando – mas a passos bem curtos. Eu consegui justificar para mim mesma quase todos os seus atos no primeiro livro, mas neste segundo... Tudo que digo é que senti bastante raiva do “adendo”. Mesmo com todo o suporte dos Pixies e com sua mãe segura e feliz na Vila Ipanema, ele continua cometendo os mesmos erros, sendo arrogante e sedento por poder. O anti-herói do Dona Marta, porém, é uma das coisas que faz a série A arma escarlate fantástica: aqui não temos lugar para personagens planos como na maior parte dos livros do gênero. Todos tem defeitos, e por maiores que sejam, não nos impedem de chorar e torcer.

Enfim, falar de um livro do qual gostei tanto é bastante difícil, mas posso dizer comecei 2015 com o pé direito e bastante “sorte literária”. Resta agora a espera (que me parecerá longa mesmo se durar pouco) pela continuação dessa magnífica aventura.


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